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Coração valente: amor pelo voleibol levou brusquense para brilhar no Canadá

Karoline Tormena, de 24 anos, falou da carreira e relembrou infância em Brusque

Publicado em 04/09/2020 às 05:35
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(Foto: Arquivo pessoal)

A brusquense Karoline Tormena coleciona títulos no voleibol. Hoje ela é atleta bolsista da Vancouver Island University e atua pelo VIU Mariners, uma equipe universitária canadense.

Sua carreira começou na escolinha de voleibol do Colégio São Luiz, em Brusque, até se mudar para Nova Trento para defender a equipe da cidade vizinha. Em 2014, ela fechou contrato com o Minas Tênis Clube e passou a disputar a Superliga de Voleibol Feminino, maior competição nacional da modalidade.

Por diversas oportunidades ela defendeu também a Seleção Brasileira de Voleibol, disputando várias competições vestindo as cores verde e amarela dentro de quadra.


A paixão de Karoline Tormena pelo esporte começou muito cedo e possui histórico familiar. Seu pai jogava vôlei na Sociedade Esportiva Bandeirante e sua irmã na escola, e com ela não foi diferente.

Herdando esse gosto pela modalidade, ela assistia os jogos na televisão e admirava muito o campeão olímpico Giba. “Eu lembro que quando eu tinha três ou quatro anos eu ficava sentada do lado do meu pai na sala vendo vôlei, mas não de uma forma distraída, eu assistia focada e observava o que os atletas faziam”, conta.

E foi observando cada movimento dos atletas que ela ingressou aos poucos na modalidade. Apesar de praticar diversos esportes ao mesmo tempo quando criança, o carinho pelo vôlei era especial.

Hoje, Karoline possui boas lembranças da época em que começou a jogar, ainda quando morava em Brusque. “Nós tínhamos uma redinha do lado de casa e a gente sempre jogava lá. Quando não tinha ninguém para jogar comigo eu fazia o meu pai tirar o carro da garagem para eu bater bola na parede, onde ficava fazendo manchete e toque”, revela.


O início da carreira

Karol estudava no Colégio São Luiz. Foi lá que sua paixão pelo esporte aumentou. Ela, então, ingressou na escolinha de voleibol com a professora Simone Tôndolo, sua primeira treinadora. “Quando surgiu a oportunidade de ter escolinha, que era com a Simone, eu lembro que foi uma realização poder participar, eu ficava feliz da vida. Quando fui comprar minha primeira joelheira, foi uma das melhores sensações que eu já tive”, diz.

Procurada pela reportagem, a primeira professora de voleibol de Karoline, Simone Tôndolo, comentou sobre o sucesso e a carreira da atleta. “É muito gratificante para mim como professora de iniciação em voleibol saber que meu trabalho contribuiu para atingir um resultado tão expressivo. Sabemos que para termos um resultado assim, precisamos de muita determinação, empenho e dedicação, e isso a Karol sempre teve, o que ajudou muito no seu desenvolvimento. Me sinto muito feliz, realizada e grata pelo reconhecimento e lembrança de ser sua primeira professora e incentivadora”, disse.

O fato de Karoline tentar imitar os trejeitos dos atletas que via na televisão refletiu nas quadras. Quando ia para os treinos, tentava repetir aquilo que os jogadores faziam.

Ao mesmo tempo em que Karol iniciou na escolinha, sua irmã mais velha começou a treinar voleibol na Sociedade Esportiva Bandeirante. Muitas vezes, a até então iniciante ia nos treinos para ajudar como gandula. Vez ou outra, porém, batia uma bolinha com as mais experientes. Como ela era cerca de quatros anos mais nova que a maioria, as outras meninas não utilizavam a mesma força para bater na bola. O resultado: a pequena ficava brava pela cautela. A garota queria mesmo é ser desafiada. Irritada, muitas vezes chegava a chorar.

Conforme os tempos foram se passando e as práticas se aperfeiçoando, a atleta começou a jogar com as meninas de dois e três anos mais velhas. Aos 10 anos de idade entrou para a escolinha do Bandeirante e passou a treinar com o professor Daniel Pieper, além de começar a disputar campeonatos no nível iniciante.

“Geralmente no iniciante não se faz muita coisa além de passar a bola de um lado e para o outro e eu tentava fazer o vôlei ficar super profissional, mas eu era muito ‘ruinzinha’ (risos)”, diz.

Karoline lembra que seu treinador, Daniel, foi essencial no início da sua evolução, quando ela ainda era uma criança e o esporte era apenas um hobby. “Aos poucos eu fui melhorando, eu lembro que ele começou a me dar uns treinos que me ajudaram a evoluir demais”, afirma.

Daniel Pieper, em entrevista a reportagem, lembrou da época que foi o professor da escolinha em que Karol Tormena participava e comentou sobre a alegria de ver seu sucesso na carreira. “É uma satisfação enorme ajudar uma criança a realizar seu sonho, contribuir na formação do seu caráter como atleta”, afirma.

“Lembro da Karol e sua paixão pelo voleibol, uma dedicação imensa. Hoje ela é um exemplo, uma motivação para quem está começando. Estarei sempre torcendo para que ela realize seus sonhos. Ela é um orgulho meu, da professora Simone e do Colégio São Luiz, que participamos ativamente dessa história linda e de sucesso”, elogia.

Após um tempo participando de competições para iniciantes, foi a vez de Karoline disputar campeonatos estaduais. O Bandeirante, equipe que ainda estava ativa na época, chegou inclusive a participar da Taça Paraná, alcançando a sexta posição no torneio.

E foi nessa competição que Karoline Tormena conquistou seu primeiro prêmio individual, de melhor atacante do campeonato. “Eu lembro que eu soube só depois que eu tinha conquistado esse prêmio, quando já estava em casa. Eu fiquei super feliz, nem sabia o que fazer de tão feliz que eu fiquei”, lembra.

Assim como muitos atletas, Karol também passou por dificuldades no sonho em crescer na modalidade. “Uma época o projeto de vôlei não estava mais dando certo no Bandeirante. Eu lembro que o meu pai foi atrás de patrocinador e de tudo para fazer o vôlei acontecer em Brusque. Ele ficou à frente do nosso projeto por dois anos no objetivo de mantê-lo, porque ele sabia que isso era minha paixão de muitas outras meninas que jogavam ali”, lembra.


Até logo, Brusque!

Em 2010, Karoline apostou em se dedicar unicamente ao esporte. A adolescente e sua família, então, se mudaram para a cidade de Nova Trento, município catarinense conhecido por ser pólo formador de grandes atletas da modalidade.

A jovem deixou o Colégio São Luiz e começou a treinar no Voleibol Nova Trento, com a Vandeca, técnica que até hoje está a frente da escolinha de vôlei neotrentina. Foi por lá que Karol encerrou seus estudos no ensino médio.

Atuando como atleta do Voleibol Nova Trento e já decidida que faria de tudo para seguir sua carreira no esporte, Karoline Tormena começou a disputar competições de grande importância para os mais Jovens, como por exemplo os Jogos Escolares de Santa Catarina (Jesc), torneio que venceu no primeiro ano em que disputou.

O campeão do Jesc se classificava para os Jogos Escolares Brasileiros (Jebs), competição sediada em Fortaleza e uma das principais do país para os adolescentes. Na oportunidade, o Voleibol Nova Trento ficou em segundo lugar.

O título não veio, mas graças ao bom desempenho na competição, Karoline foi convocada para a Seleção Catarinense de Voleibol, onde começou a treinar e disputar mais campeonatos.

Foi então que um olheiro da Seleção Brasileira indicou Karol para disputar uma peneira na sede da Confederação Brasileira de Voleibol (CBV), em Saquarema (RJ). Porém, ela acabou não sendo convocada naquela ocasião, pois, participou do processo seletivo com atletas que eram dois anos mais velhas e possuíam mais experiência.

O Voleibol Nova Trento ficou em segundo lugar no primeiro ano de Karoline no Jebs. A equipe vencedora foi um time do Rio de Janeiro, que posteriormente convidou a brusquense para vestir a camisa da equipe carioca para disputar um Campeonato Sul-Americano, onde a equipe conseguiu a vaga justamente por vencer a etapa nacional. Após uma semana de treinos no Rio de Janeiro, a brusquense foi com sua mãe para o Peru disputar a competição. A equipe ficou campeã.

Karoline dedica o seu leque de oportunidades em 2010 aos ensinamentos recebidos no Voleibol Nova Trento, que fizeram ascender seu início de carreira no esporte. “Meu primeiro ano em Nova Trento foi uma experiência muito boa”, afirma.

Em 2011, em seu segundo ano jogando pelo time neotrentino, participou de muitas competições importantes e novamente foi convocada para a Seleção Catarinense, época em que teve oportunidade de se sagrar campeã em muitos campeonatos.


Convocada para a Seleção Brasileira

No mesmo ano, em 2011, surgiu sua primeira convocação para a Seleção Brasileira. Karol Tormena foi escalada para jogar o Campeonato Sul-Americano, no Uruguai. Logo na estreia com a camisa verde e amarela, ficou campeã.

Em 2012, seguiu atuando pela Seleção Brasileira e jogou outro Campeonato Sul-Americano, ficando em segundo lugar, perdendo apenas para a seleção peruana na final, representante do país que sediou a competição. “É um jogo que fica na minha memória de tanto que eu chorei após aquela derrota, mas tudo nós vamos aprendendo”, conta.

O ano de 2013 marcou sua primeira disputa no campeonato mundial de voleibol com a Seleção Brasileira. Karol ficou seis meses na CBV, em Saquarema, treinando para a competição, que foi sediada na Tailândia, onde vários países e diferentes escolas de voleibol disputaram. O Brasil ficou em terceiro lugar.

Karoline reforça que atuar pela seleção nacional é de extrema importância e o ‘peso da camisa’ é enorme. “É uma pressão, porque todos os resultados sempre foram muitos positivos, sempre que usei a camisa do Brasil foi uma pressão muito grande. O resultado tem que vir, querendo ou não.”


Uma oportunidade em SP

O desejo era seguir na profissão. Ainda em 2013, quando atuava por Nova Trento, Karol Tormena passou a tentar jogar por outras equipes, visando escalar para um nível maior, na tentativa de um dia conseguir participar da Superliga de Voleibol Feminino, o principal campeonato de clubes do País.

Quando já estava praticamente ‘de malas prontas’ para jogar em uma equipe de voleibol paulista, teve de abandonar a oportunidade por um problema de arritmia cardíaca que adquiriu ainda quando era criança.

Apesar de não atrapalhar diretamente nos jogos, vez ou outra durante a partida, o coração da atleta começava a bater muito rápido e ela precisava ficar no banco de reservas para descansar por um período de tempo. Neste momento, a ansiedade era sua maior inimiga, pois quando isso acontecia, ela ficava ainda com mais vontade de voltar para quadra, o que agravava a situação e fazia com que tivesse que ficar ainda mais tempo aguardando para retornar ao jogo.

Por conta desse problema de saúde, a equipe de São Paulo só aceitaria a atleta no time se fizesse uma cirurgia para acabar de vez com esse problema. Porém, ainda adolescente, tinha muito medo de fazer uma operação. A atleta, então, acabou descartando a possibilidade de fechar contrato com a equipe paulista.

Nem tudo está perdido

Karoline Tormena seguiu jogando pelo Voleibol Nova Trento durante a época em que estava em negociação com o clube de São Paulo. No final de 2013, em um Jebs disputado no Pará, o ex-atleta campeão olímpico, Anderson Rodrigues, viu Karol jogar, gostou muito de sua postura na quadra e fez uma proposta para ela atuar no Minas Tênis Clube, outra equipe de grande expressão na Superliga.

De imediato, Karoline negou a proposta, pois na época que tinha recebido o convite, estava praticamente fechada com a equipe paulista. Porém, como o acerto com o clube não se concretizou, ela acabou ligando para Anderson Rodrigues e perguntou se ainda haviam condições para que ela atuasse pelo clube mineiro. A reposta foi positiva. Em 2014, ela se mudou para Belo Horizonte e uma nova oportunidade começou em sua vida.

Um dos maiores desafios de seu primeiro ano foi quando passou a atuar na categoria adulto, com atletas que disputavam a Superliga Feminina. Porém, de início, jogou poucas partidas. “Foi uma época muito legal, mas ao mesmo tempo foi muito difícil, pois o nível de juvenil para o adulto é um passo muito grande. Eu ainda era bem nova e treinava com mulheres experientes que eu sempre via jogar. Nunca acreditei que poderia jogar junto com elas”, diz.


Ela novamente foi convocada para a Seleção Brasileiro, onde ganhou mais um Campeonato Sul-Americano, desta vez na Colômbia. Quando retornou da competição, em seu primeiro ano em Belo Horizonte, disputou vários torneios pelo Minas Tênis Clube, como o Campeonato Mineiro. E mesmo jogando por um clube de outro estado, seguia sendo convocada pela Seleção Catarinense de Voleibol.

Em 2015, ainda jogando na categoria juvenil do Minas, disputou mais uma vez o Campeonato Mundial de Voleibol, em Porto Rico, competição em que ficou em segundo lugar com a Seleção Brasileira, perdendo para a República Dominicana na final.

“Nestes campeonatos com a Seleção Brasileira, nós geralmente ficávamos cinco ou seis meses em Saquarema, voltando para casa de 15 em 15 dias. Era um período difícil, mas a sensação de vestir a camisa do Brasil era muito boa”, conta. Nesta época ainda, ela começou a viajar mais com o Minas Tênis Clube.

Na temporada 2015/2016 da Superliga de Voleibol, ela frequentemente entrava para jogar. E no final do campeonato, disputou sua primeira competição na categoria sub-23 com a Seleção Brasileira.

As oportunidades que estava recebendo para entrar em quadra pela equipe de Belo Horizonte motivaram na continuidade de seus treinamentos. “Jogar no Minas foi muito especial porque eles têm uma torcida enorme. O ginásio ficava lotado e era gigantesco. Era um sentimento uma bom, eu me sentia muito bem”, afirma.


De volta para as salas de aula

Depois de um bom tempo atuando pelo Minas Tênis Clube e jogando a Superliga, Karoline começou a ter um olhar diferente em relação ao profissional e a vida.

Analisando por experiências de outras atletas e por não ter estudo após a conclusão do ensino médio em Nova Trento, ela teve a ideia de conciliar o esporte com os estudos. “Me despertou um interesse diferente de poder estudar e ao mesmo tempo jogar, utilizar o vôlei para ganhar uma bolsa de estudos”, explica.

Após uma conversa com seu namorado, os dois foram estudar na Vancouver Island University e Karol hoje atua pelo VIU Mariners, uma equipe universitária canadense. Com o esporte, ganharam a bolsa de estudos e, hoje, utilizam da profissão para a própria educação.

Quando ela deixou Minas Gerais e começou a morar no exterior, Karol iniciou jogando pelo VIU Mariners e estudando inglês, que melhorou muito desde quando chegou. Hoje em dia Karoline está fazendo o curso de Gestão de Esporte e Recreação na universidade.

A liga canadense de voleibol possui um nível de dificuldade inferior quando comparado com a Superliga Feminina. Lá ela já conquistou diversos títulos, como a medalha de ouro em campeonatos estaduais e nacionais, além de ser a melhor atleta de todas as modalidade da Pacwest, a competição do estado, na temporada 2018/2019 e 2019/2020.

Neste meio tempo, os planos iniciais de Karoline morando no exterior acabaram passando por uma alteração significativa. “No início o meu projeto era continuar aqui, estudar, me formar e voltar para o Brasil, mas agora com toda a situação política, econômica e de segurança, eu acho que acabei mudando meus planos. Eu penso também muito em ficar aqui”, afirma.


De Brusque para o mundo

Apesar de hoje estar em outro patamar de sua carreira, Karoline não esquece a cidade onde tudo começou: Brusque!

Foi no município catarinense que sua paixão foi descoberta, cidade pelo qual possui muito carinho e orgulho ao contar de onde sua história na modalidade nasceu. “Eu sou apaixonada por Brusque, é a cidade da minha família, é a cidade onde eu cresci. É um município que eu tenho no coração e que sempre estará comigo, é a minha cidade! Sempre é um orgulho muito grande poder falar que sou de Brusque”, afirma.

Karol reforça também que tudo que foi concretizado em sua carreira profissional foi graças ao apoio que sempre foi prestado pela sua família, que a incentivaram na prática do esporte. “Minha família sempre foi importante na minha carreira, principalmente meus pais, eles sempre me apoiaram, onde quer que eu estivesse eles iam. Eles viajavam, eles me ajudavam, eles faziam comida para mim... Sempre se dedicaram muito a mim e a minha irmã. Sem eles eu não chegaria onde eu cheguei”, diz.

O pai de Karoline Tormena, Everaldo Tormena, fala com orgulho da carreira da filha e de todas suas conquistas até os dias atuais. “É muito gratificante ter acompanhado todo o processo da evolução da Karol, sabíamos que desde o seu começo, tinha o dom para o vôlei, só precisava ser lapidado com muita calma, paciência e prudência, como toda jóia bruta”, elogia.

“Procuramos sempre estar por perto. Mesmo quando ela nem sabia, vieram as dificuldades, a saudade, a distância, e sempre nos mantivemos prontos para o que fosse necessário, pois era uma menina simples e humilde que estaria entrando para um mundo desconhecido, agressivo e às vezes cruel. Hoje Karol, com seus 24 anos de idade, é uma pessoa madura, decisiva, aguerrida e carinhosa, que ainda está em busca dos seus sonhos”, ressalta.

por Thiago Facchini

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