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Dezoito anos do fracasso argentino na Copa de 2002

Seleção treinada por Marcelo Bielsa teve campanha recordista nas eliminatórias, mas não passou da primeira fase na Coréia e no Japão

Publicado em 15/06/2020 às 00:12
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Há 18 anos ocorria uma das maiores decepções de uma seleção em uma Copa do Mundo. A favoritíssima Argentina, que havia passado com facilidade pelas eliminatórias e vencido fortes seleções em amistosos pré-mundial, era eliminada na fase de grupos do Mundial de 2002. O país ainda tentava se recuperar da pior crise econômica de sua história, no ano seguinte, com cinco presidentes em 12 dias, bloqueios bancários, protestos violentos, recessão, desemprego e crescimento da pobreza.


A equipe de Marcelo Bielsa chegava como a seleção mais poderosa. Afinal, terminou as eliminatórias para a Copa com 43 pontos, um recorde no atual formato. Foram 13 vitórias, 4 empates e uma derrota, com diferença de doze pontos para o Equador, segundo colocado. A Seleção Argentina era ofensiva, equilibrada e eficiente. Resultados que credenciavam o selecionado como amplo favorito ao lado da França, campeã em 1998. Ambas equipes, porém, não superaram a fase de grupos. Os franceses, por exemplo, voltaram para casa sem sequer anotar um gol.

A magnitude do fracasso se traduz em uma realidade objetiva: foi a pior participação argentina em um Mundial nos últimos 40 anos. E a classificação mais baixa, 18ª colocação. O futebol pode ser muito ingrato. Dois jogos eclipsaram quatro anos brilhantes.

É preciso recordar que antes mesmo da bola começar a rolar na Coréia e no Japão, Marcelo Bielsa tomou decisões que convidavam seus detratores a detona-lo. Levou o veterano Claudio Caniggia, que sequer havia participado da campanha nas eliminatórias e participado de apenas dois amistosos com o plantel. Ainda por cima, Caniggia estava longe de sua plenitude física. Se o que pretendia Bielsa era aportar experiência ao grupo, poderia ter pego o exemplo da Espanha, que levou o veterano arqueiro Santiago Cañizares na delegação mesmo após ele ter sofrido uma lesão na véspera da Copa. Por essa consideração absurda ao carrasco do Brasil em 90, abriu-se mão de jogadores como Javier Saviola e Juan Román Riquelme, que se destacavam e possuíam a juventude que o esquema intenso de Bielsa tanto precisava.

Diego Simeone, hoje treinador do Atlético de Madrid e na época volante da equipe, sofreu uma lesão no joelho e não se recuperou a tempo de estar à altura de um mundial. O time sentiu falta de seu ritmo de jogo para desarmar os adversários no meio campo. Na derrota para a Inglaterra, na segunda rodada, Bielsa optou por um meio com inferioridade numérica, com Simeone, Verón e Sorín. Muita carga para um sistema de pressão e dinâmica que só se sustenta com a entrega plena de seus executantes. Outros jogadores sofriam com lesões e dificuldades físicas: Almeyda, Gallardo, Crespo, Ayala... O defensor, por exemplo, lesionou-se em um aquecimento antes da partida de estreia, contra a Nigéria. Muitos soldados feridos antes mesmo de que se desse o primeiro tiro. Juan Sebastián Verón, principal articulador e termômetro da equipe nos quatro anos anteriores, também esteve longe de sua melhor forma.

O sorteio já havia sido cruel com o time de Bielsa. Nigéria, Suécia e Inglaterra estavam no caminho e completavam aquele que foi chamado já de cara como o “Grupo da Morte”. Na estreia, uma atuação pouco convincente, mas com vitória por 1 a 0 com um gol de cabeça de Gabriel Batistuta após cruzamento fechado. O jogo seguinte foi contra a Inglaterra, rival histórico. Em uma manhã de sexta-feira, a derrota por 1 a 0 com gol de David Beckham de pênalti deixou incrédulos e preocupados os milhões de argentinos pelo mundo.


Em um 12 de junho, só restava uma opção: vencer a Suécia. Um tal Svensson cobra falta com maestria e Cavallero não alcança, gol dos escandinavos. A angústia e a pressa tomam conta da esquadra argentina que ainda consegue um pênalti cavado no final. Ortega cobra, o goleiro dá rebote e Crespo empata, mas uma seleção que já não consegue racionalizar suas ações não consegue o triunfo, apesar de seu 65% de posse de bola. A madrugada mostra os atletas argentinos estirados no chão em lágrimas. Gabriel Batistuta é o maior símbolo do fracasso. A última imagem do histórico artilheiro com a camisa da seleção é de um camisa 9 abatido e aos prantos.

Dezoito anos depois, chega-se a conclusão de que foi uma equipe que sofreu muito com a falta de precisão ao finalizar e viveu de bolas paradas (marcou dois gols dessa forma e sofreu outros dois assim), teve pouca capacidade de absorção após sair atrás no placar, algo que havia sido muito raro no ciclo das eliminatórias. Faltou um plano B, para perfurar as equipes que se defendiam com oito jogadores nos últimos 30 metros.


Entretanto, poucos questionaram Bielsa durante todo o ciclo antes do Mundial. Para a grande maioria dos torcedores, jogadores, dirigentes, técnicos e jornalistas, essa seleção representava em sua essência a forma argentina de jogar futebol. Uma equipe que venceu com brilhantismo único as eliminatórias e soube dominar potências europeias em amistosos jogados como visitante. Durante os seis anos de seu mandato como treinador da seleção (1998-2004), obteve resultados que nenhum outro selecionador conseguiu. A eliminação na Copa de 2002 segue sendo uma ferida aberta e ainda deixa o sentimento de que aquele time poderia chegar muito mais longe.

Melhor para o Brasil, que conquistou o troféu após uma campanha irretocável. A ironia é que a seleção canarinho classificou-se com dificuldades para o Mundial, ao contrário dos hermanos. Um time que encantou os olhos do mundo, inclusive deste que escreve. 

Após o fim do mundial, Marcelo Bielsa seguiu no cargo por mais dois anos e conquistou as Olímpiadas de 2004.


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