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TOCO Y ME VOY

Aimar, o pensador

Ex-craque da Seleção Argentina, o agora treinador traz reflexões interessantes sobre o futebol e suas movimentações táticas

Publicado em 15/04/2020 às 23:05
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O histórico escritor argentino José Luis Borges não gostava de futebol. Talvez porque não o entendia, ou porque o entendia demais. “São onze jogadores que correm atrás de uma bola para tratar de metê-la em uma trave. Algo absurdo, e essa estupidez deixa as pessoas apaixonadas. A mim me parece ridículo”, dizia. 

No início de 2018, seu conterrâneo, o ex-jogador Pablo Aimar disputou sua última partida oficial. Encerrava sua brilhante carreira pelo Estudiantes de Rio Cuarto, clube semi-profissional que o viu nascer para o futebol. Algum tempo depois, foi nomeado treinador da seleção sub-17 do país e concedeu uma entrevista interessante que faz recordar a fala de Borges. “No futebol há uma bola e 22 jogadores. Cada jogador toca na bola por três minutos cada dos noventa totais”, declarou. Até aí parece uma questão matemática mas o que chama atenção é a reflexão que faz o ex-craque de River Plate, Valencia, Benfica e Seleção Argentina. “Então, se você consegue se mover para que um companheiro faça um gol, você é um gênio. Se você conseguir dar uma solução para seu companheiro, você joga para a equipe. No futebol, os melhores jogadores são os que fazem jogar bem os outros. Você pode ter o melhor lateral direito do mundo, que corra como Usain Bolt, mas se você não facilitar ou não passar a bola no espaço correto, pode torna-lo o pior do mundo”, finaliza. 


El Payaso nos tempos de jogador. Foto: Arquivo

Quem nunca disputou uma “pelada” com os amigos, e sofreu com alguém habilidoso que quer demonstrar todas suas virtudes de malabarista da bola em apenas uma hora? Aquele que não passa a bola pra ninguém e que desperta comentários como “fominha” ou “leva a bola pra casa”. Se supõe que o jogador profissional já sabe destas coisas, mas não pode ser encarado como uma mera suposição porque senão Aimar não falaria sobre isso quando lhe perguntam sobre individualismo em um jogo. Vale recordar um comentário de Pep Guardiola a Sergio Busquets quando treinava seu mítico Barcelona. “Com um toque você é o melhor do mundo, com dois toques você é muito bom, com três, você é normal”. Resumindo: o melhor jogador é o que joga para a equipe e faz os seus companheiros melhorarem. 

Fazer estas coisas que correspondem aos outros 87 minutos que um jogador não tem a bola nos pés é o que provavelmente o transforma num bom jogador de equipe. Ocupar um espaço, arrastar uma marcação... A necessária distração para que no momento exato, aproveite a oportunidade. Com exceção dos super craques, nestes três minutos que tem a bola, são todos mais ou menos parecidos, sempre e quando entendam o jogo. E o mais paradóxico de tudo, aprender a jogar sem a bola, embora ela seja a protagonista que leva qualquer criança a querer ser futebolista. Talvez aí está a diferença entre jogar futebol e jogar bola. 


Foto: Gustavo Ortiz - Diario AS

Ter um tipo como Pablo Aimar orientando e passando sua filosofia a novas gerações de jogadores é uma excelente notícia. “Eu gosto muito desta parte do esporte, houveram pessoas que me ensinaram e agora devo seguir o caminho até os mais jovens. Mas você tem que gostar do jogo. Você pode ter o melhor professor de guitarra, mas se não gosta de tocar... Eu creio que só uma maneira de conseguir a melhora de um jogador: pela paixão. Sem paixão, o futebol não tem nada.” Numa realidade cada vez mais efêmera, onde a partida de PlayStation dura 5 ou 7 minutos, ou um vídeo no YouTube te mostra os gols ou melhores lances de todo o mundo, este tipo de discussão é extremamente necessária.

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